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Hutukara: o ‘mundo’ unificado dos povos Yanomami

A denominação pode ser utilizada para representar o 'universo', a integralidade das coisas, a própria noção de mãe natureza.

Em um mundo globalizado, os recursos naturais são enxergados como mera matéria-prima para a fabricação de produtos. Árvores não passam de celulose para fazer papel, pedras preciosas para a fabricação de joias, soja para alimentar o gado e para produzir combustível. O uso da natureza para fins de consumo é comum, “em nome do progresso”.

A lógica capitalista substitui a visão natural de mundo pela visão do negócio, da venda, da comercialização e do enriquecimento. Os povos originários, entretanto, tem outra visão sobre a relação do ser humano com a natureza, sendo uma unidade com ela, uma peça harmônica no mundo, não seu dono.

O povo Yanomami, em especial, tem uma visão integrada da ‘mãe-natureza’. Conhecida por eles como Hutukara, a unidade a quem o ‘homem branco’ chama de mundo, é composta por todas as coisas, de maneira holística (completa, por inteiro).

Seja água, terra, animais, plantas, ou até mesmo os seres humanos. Todos são parte da Hutukara. A etimologia da palavra em si significa ‘o céu original a partir do qual se formou a terra’, fazendo referência a rica cosmologia deste povo.

Davi Kopenawa, famoso escritor, líder político e xamã Yanomami amazonense, explicou em 2013, em diversas conferências realizadas na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) a relação de seu povo com a natureza. Durante seminários o tema mais recorrente foi a Hutukara.

“Para nós, indígenas, a Hutukara sustenta nossa fome, sustenta a nossa comida. A comida vem de onde? A comida vem da Hutukara. A nossa mãe, o nosso pai, trabalham por ela, plantam a alimentação, e a Hutukara deixa nascer e crescer para a gente comer. O pensamento Yanomami é diferente, não podemos destruir. Destruir e ameaçar a terra para nós não é bom. Nós temos que respeitar porque a Hutukara é igual nós, ela está viva”, declarou, na ocasião.

A atual situação do povo Yanomami revela o conflito entre os mundos. Após a invasão de seu território por garimpeiros ilegais, a etnia Yanomami luta para manter seus direitos pela terra. De um lado um povo que vive, ou tenta viver, em harmonia com a natureza, do outro, garimpeiros que exploram a Hutukara em prol do capital, do dinheiro.

Outro importante escritor e pensador indígena é Ailton Krenak, de Minas Gerais. O autor do livro ‘Ideias para adiar o fim do mundo’, corrobora com a visão Yanomami e também faz reflexões acerca da maneira como se trabalha a subjetividade, formas de enxergar a realidade e como ela pode implicar na maneira com que o planeta tem sido irremediavelmente explorado. No livro, Krenak diz:

“Sentimo-nos como se estivéssemos soltos num cosmos vazio de sentido e desresponsabilizados de uma ética que possa ser compartilhada, mas sentimos o peso dessa escolha sobre as nossas vidas. Somos alertados o tempo todo para as consequências dessas escolhas recentes que fizemos. E se pudermos dar atenção a alguma visão que escape a essa cegueira que estamos vivendo no mundo todo, talvez ela possa abrir a nossa mente para alguma cooperação entre os povos, não para salvar os outros, mas para salvar a nós mesmos.”

Estas formas de se enxergar o contato com a natureza convidam à reflexão. Principalmente frente as recentes mudanças ambientais provocadas pela ação do ser humano no mundo.

Fonte: Portal Amazônia

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